Por Karine Frehner Kavalco, 2004.
Genética se remete ao estudo das origens. As definições mais rudimentares a consideram a “teoria que explica a origem ou a produção dos seres. Parte da biologia que estuda a origem e a transmissão hereditária dos caracteres e das propriedades dos seres vivos”. Atualmente considera-se que se trata do estudo da transferência de informação biológica de célula para célula, dos pais para os filhos, e assim, de geração em geração. A genética também trata da natureza química e física da própria informação.
Gregor Mendel (1822-1884) é considerado o pai da genética – embora não a tenha chamado assim -, tendo publicado seus experimentos com ervilhas (Pisum sativum) em 1866, realizados no jardim do Mosteiro de Altbrünn, Áustria. Estes trabalhos geraram o fundamento da genética atual, considerada contemporaneamente uma ciência de potenciais. Embora não tenha sido o primeiro pesquisador a realizar experimentos com hibridizações, Mendel foi quem primeiro considerou os resultados em termos de características individuais. Ele aplicou o método científico, realizou os experimentos necessários, contou e classificou as ervilhas resultantes de cruzamentos, comparou as proporções com modelos matemáticos e formulou hipóteses para explicar as diferenças. Embora ele tivesse delineado respostas matemáticas para o que observara, não conceituou biologicamente o fenômeno que presenciara, o que talvez tenha feito suas descobertas caírem no desconhecimento. Apenas em 1900 a teoria de Mendel foi redescoberta. Três botânicos foram responsáveis pelo reaquecimento de suas idéias: H. de Vries (Holanda), C. Correns (Alemanha) e E. von Tschermak-Seysenegg (Áustria). Cada um com sua linha de pesquisa, estes três ícones da genética obtiveram evidências para os princípios de Mendel, a partir de experimentos independentes. Em 1905 W. Bateson deu a essa ciência em desenvolvimento o nome de “Genética”, em referência ao termo grego correspondente a “gerar”.
Bateson também criou o termo “alelo”, originalmente cunhado como “alelomorfo”, referindo-se os membros dos pares que controlam as diferentes características alternativas. Nos anos subseqüentes vários pesquisadores demonstraram a influência dos genes na determinação dos variados fenótipos, embora o termo “gene” tenha sido derivado do termo darwiniano “pangene”, usado pela primeira vez por W. L. Johannsen. O conceito de gene está implícito na visualização mendeliana de um elemento ou fator físico, atuando como fundamento para o desenvolvimento de uma característica.
Talvez as mais expressivas contribuições à consolidação da genética como ciência derivam de estudos que identificaram os componentes celulares físicos (biomoléculas) relacionados aos genes, e, portanto, à transmissão das características herdáveis. Com a descoberta dos cromossomos e sua relação com os genes, nasceu a citogenética, onde os estudos do componente nuclear das células e da transmissão da informação genética são fundidos. A teoria do gene como unidade discreta de um cromossomo foi desenvolvida por T. H. Morgan e colaboradores, em estudos com a mosca das frutas, Drosophila melanogaster. De igual importância são as descobertas posteriores dos componentes bioquímicos relacionados com a dinâmica do fluxo da informação genética, como o estudo das enzimas nucleares, bem como do próprio DNA e do RNA, e de outras biomoléculas. Surgiu assim a genética molecular. Embora a composição química do DNA já fosse conhecida, a descoberta de estrutura física bem como do mecanismo de sua replicação, pela dupla J. D. Watson e F. H. C. Crick revolucionou o estudo da genética na década de 50.
Hoje, a genética oferece inúmeras nuances e vários horizontes para pesquisa. Começam a pipocar os estudos genômicos, onde todo o conteúdo genético dos organismos passa a ser investigado, bem diferente dos primeiros estudos onde cada gene ou grupo de genes era separadamente analisado. As aplicações dos dados gerados pelos inúmeros projetos “Genoma” são infindáveis, e vão desde o melhoramento genético de muitas espécies de interesse comercial até perspectivas humanizadas, buscando a melhoria da qualidade de vida de muitas pessoas e a cura de doenças que até há pouco mostravam-se impossíveis de aniquilação. Além disso, as contribuições para a biologia evolutiva são inumeráveis.
A Engenharia Genética oferece oportunidade de incrementarmos características específicas, ou criarmos organismos “trabalhadores”, que sintetizam compostos como a insulina humana, por exemplo. Talvez os avanços mais marcantes sejam os resultados positivos no incremento de valor nutricional em vegetais e experiências revolucionárias, como a incorporação de vacinas aos alimentos, por meio de transgenia. Hoje o ser humano manipula os genes, e, dando tempo para a ciência testar todas as potencialidades de que dispõe, os resultados prometem aumentar nossa qualidade de vida, que é um dos propósitos das Ciências Biológicas.